Nos dias 05 e 06 de agosto aconteceu na Universidade de Brasília o IV Encontro Nacional da Fasubra LGBTQIA+. Com tema central “Cidadania LGBTQIA+ na Educação Pública e na Sociedade”, o encontro teve como objetivo identificar estratégias de interação entre as trabalhadoras e os trabalhadores das universidades e a comunidade LGBTQIA+, a partir de políticas de diversidade e inclusão.
O evento contou com três mesas de debates e oito palestrantes. A programação também buscava fomentar políticas de convivência na comunidade universitária, aumentar o interesse das entidades de base em discutir o tema com a categoria e coletar informações sobre as políticas de diversidade e inclusão no movimento sindical e nas universidades, possibilitando a identificação de diversas estratégias para o convívio entre a pluralidade de gênero no meio acadêmico.
A abertura do evento contou com a participação especial de Dóris, uma personagem criada pelo Coordenador LGBTI da Fasubra Sindical e Coordenador Geral do Sintufes, Wellington Pereira. Dóris explicou o significado das letras da sigla LGBTQIAPN+ e deixou claro: o principal não é saber o significado das letras, mas sim respeitar a todes, todas e todos, independentemente da orientação sexual e da identidade de gênero de cada um.
*O roteiro (da performance do coordenador Wellington Pereira e da personagem Dóris) é do ator e apresentador Vitor diCastro. O texto está divulgado neste vídeo postado na rede social do ator.
Durante os dois dias de evento, o Sintufes também foi representado pelos Técnico-administrativos em Educação Viviana de Paula Corrêa, da Diretoria de Ações Afirmativas e Diversidade da Proaeci e Wagner Nunes Nascimento, trabalhador da Unidade de Diagnóstico por Imagem no Hucam.
O Encontro não teve caráter deliberativo, mas gerou proposições não apenas para a Fasubra Sindical, mas também às entidades de base, tais como a urgência em haver pelo menos uma atividade de formação para consolidação da pauta em 2022, a indicação de criação de um GT Diversidade sexual e de gênero ainda em 2022, e a demanda de criação de uma coordenação local LGBTQIA+.
Confira abaixo o que aconteceu nas Mesas.
MESA 1 – Carla Ayres e Andrey Lemos
A primeira mesa do evento foi composta por Carla Ayres e Andrey Lemos. Carla, vereadora pelo PT para a Câmara Municipal de Florianópolis, discorreu sobre o combate à violência e a promoção dos direitos de cidadania LGBTQIA+ nas políticas públicas. A vereadora pontuou que a cidadania é o “direito a ter direito” e que é fundamental exercer esse direito a partir do rompimento com a desigualdade, da garantia de acesso aos direitos fundamentais e aos direitos humanos e do combate ao preconceito, ao racismo, à LGBTfobia, ao machismo e à misoginia. “Precisamos da constituição de políticas públicas que garantam a cidadania, com vistas à não violência”, afirmou Carla.
Clique aqui e assista a intervenção de Carla Ayres.
Já Andrey Lemos, integrante da UMA LGBT, servidor do Ministério da Saúde e militante ativista das pautas antirracista e LGBTQIA+, trabalhou o tema da sobrevivência LGBTQIA+ no Brasil de hoje. Andrey lembrou que o Brasil não nasceu em 1500. Pelo contrário: foram os europeus que impuseram na colonização um processo de apagamento da organização e dos modos de vida dos povos originários. Porque o colonizador (Portugal) criminalizava a homossexualidade no século XVII, tornou-se crime ser homossexual na colônia (Brasil). Andrey lembrou que no curso da história, os homossexuais foram vistos como pecadores e também como pessoas doentes que precisavam ser tratadas com choque. Nesse contexto, lembra o ativista, o SUS é revolucionário pela sua capilaridade, universalidade, por debater a necessidade de equidade e por caminhar rumo à igualdade de acesso a políticas públicas. Andrey destacou que no Brasil de hoje, enquanto 14% da população em geral amarga o desemprego, quando o recorte se dá a pessoas LGBTQIA+, o índice aumenta para 22%. Também apontou a realidade de abandono da família vivida por muitas pessoas LGBTQIA+, principalmente por Travestis e Transgêneros .
Clique aqui e assista a intervenção de Andrey Lemos.
MESA 2 – Pérsio Plensack, Lucas Brito e Elaine Leoni
A segunda mesa do evento foi composta por Pérsio Plensack, Lucas Brito e Elaine Leoni. Pérsio, arte-educador, pedagogo e assessor de formação da CUT-Brasil, debateu o sindicalismo e as lutas pela visibilidade e igualdade de direitos das pessoas LGBTQIA+ no mundo do trabalho. O pedagogo relembrou Paulo Freire e ressaltou a importância de marchas e das produções acadêmicas e culturais que lancem visibilidade sobre as LGBTQIA+. Pérsio ressaltou também que a pauta LGBTQIA+ precisa estar sempre inserida no debate político e que as LGBTQIA+ devem ocupar os espaços de poder.
Alguns vídeos de formação da foram sugeridos:
Vídeo 1 – Identidade de gênero, sexualidade e representação sindical
Vídeo 2 – LGBTQIA+: relações sociais e de trabalho
Vídeo 3 – Identidade de gênero, orientação sexual e negociação coletiva
Clique aqui e assista a intervenção de Pérsio Plensack.
Lucas Brito, mestre em Política Social, discorreu sobre a ausência de leis que deveriam proteger a comunidade LGBTQIA+. O acadêmico pontuou que o congresso federal não promulgou até hoje nenhuma lei relacionada à proteção de pessoas LGBTQIA+. Mais do que isso: apontou que no debate da Constituinte, foi reprovada a inserção de menção explícita à orientação sexual na Constituição de 88. Das várias iniciativas que tramitaram nas casas de lei, como o Programa Brasil sem Homofobia (2004), a Rubrica para Políticas Públicas LGBTs na LOA (2005) e a criação do Conselho Nacional de Combate à Discriminação LGBT (2010), o Projeto de Lei nº 612/2012, que regulamenta a união estável de pessoas do mesmo sexo, foi o que chegou mais longe: o projeto foi aprovado na CCJ do Senado, mas foi posteriormente arquivado. Tudo o que se tem de avanço atualmente foi obtido a partir de interpretações exaradas pelo Poder Judiciário. Lucas lembrou que a repressão da sexualidade é um dos frutos da repressão política e, por isso, algo contra o qual toda a classe trabalhadora deve lutar.
Clique aqui e assista a intervenção de Lucas Brito.
Elaine Leoni, Coordenadora do Comitê LGBTQIA+ da Internacional do Serviço Público (ISP) no Brasil e presidenta do Sindicato dos Enfermeiros do Estado de São Paulo, discutiu a inserção da comunidade LGBTQIA+ nos movimentos sociais e a promoção dos direitos de cidadania nas políticas públicas. Elaine apontou ser necessário que a organização sindical seja livre de discriminação quanto à orientação sexual e à identidade de gênero. Para isso, a coordenadora propõe que haja:
- Zero tolerância com a discriminação por orientação sexual e por identidade de gênero;
- Adoção de uma política sindical em prol da igualdade para trabalhadoras LGBTQIA+;
- Conscientização em relação à igualdade e ao respeito dos direitos humanos das trabalhadoras LGBTQIA+;
- Compromisso em apoiar e implementar práticas em favor das trabalhadoras LGBTQIA+;
- Organização pela promoção e desenvolvimento dos direitos das trabalhadoras LGBTQIA+;
- Promoção de práticas de inclusão e respeito pelas trabalhadoras LGBTQIA+;
- Apoio a campanhas de comunicação.
Elaine também aponta que os sindicatos devem lutar por políticas públicas para a população LGBTQIA+. Devem lutar “pelo direito de viver num Brasil onde a nossa forma de amar não possa ser o nosso maior risco de vida”, aponta a coordenadora.
Clique aqui e assista à intervenção de Elaine Leoni.
MESA 3 – Rose Bellon, Augusta Batista Baêta das Neves e Deborah Sabará
A mesa final do evento foi composta por Rose Bellon, Augusta Batista Baêta das Neves e Deborah Sabará. Rose Bellon, Cientista Social e Servidora da Secretaria de Direitos Humanos do Município de Serra debateu a importância da representatividade para a garantia de direitos da população LGBTQIA+ no ambiente sindical. Rose apontou que grupos sociais com maior vulnerabilidade devem receber atenção específica, através de políticas públicas e legislações, para que haja concretização dos direitos humanos à vida, à liberdade, à igualdade, à saúde, etc. Nesse cenário, afirmar os Direitos Humanos é central para a efetivação da representatividade das pessoas LGBTQIA+. Rose também indicou que aumentar a participação das pessoas LGBTQIA+ em todas as instâncias dos sindicatos é necessário e urgente.
Clique aqui e assista à intervenção de Rose Bellon.
Augusta Batista Baêta das Neves,, Técnica-administrativa em Educação na UFSCar e diretora da Associação Transgênero de Sorocaba (ATS) discorreu sobre a importância da mobilização das minorias representativas no contexto do avanço do conservadorismo e como tomar ações práticas para essa mobilização. Augusta lembrou que não existe ideologia de gênero, mas sim estudos de gênero. A ideia de uma ideologia de gênero tem sido propagada por grupos religiosos neopentecostais com o intuito de subsidiar a discriminação em razão da diversidade de orientações sexuais e identidades de gênero e normalizar o ódio contra LGTBQIA+. Os grupos religiosos de matriz neopentecostal tornaram-se a maior força organizada pela destruição de direitos e da cidadania LGBTQIA+. Eles são, atualmente, os maiores vetores do discurso de ódio no Brasil. A ativista também apontou para o desmonte das ferramentas de participação popular das pessoas LGBTQIA+ que visa ao extermínio de qualquer política pública LGBTQIA+ e almeja exterminar a própria população LGBTQIA+. Para fazer frente a isso, a mobilização nos sindicatos sobre a pauta deve aumentar. Torna-se fundamental a regulamentação de coletivos LGBTQIA+ e o fomento à pauta nos diversos contextos de atuação política (partidos, coletivos, diretórios etc). Augusta também chama atenção para o fato de os Conselhos Tutelares estarem sendo ocupados pelos conservadores. “O que eu estou fazendo para mudar essa realidade? Aqueles que querem nos eliminar estão organizados e agindo. E nós?”, pergunta a ativista.
Clique aqui e assista a intervenção de Augusta Batista Baêta das Neves.
Deborah Sabará, Ativista da Associação GOLD – Grupo Orgulho, Liberdade e Dignidade e coordenadora da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), debateu sobre as estratégias para a defesa e a proteção dos direitos das pessoas LGBTQIA+ nos ambientes sindical e social. Para a ativista, a tática imediata é derrotar eleitoralmente o bolsonarismo. Deborah também aponta a necessidade de se trabalhar o assunto através de um recorte racial: as mulheres travestis pretas são as maiores vítimas de agressões e assassinatos. A ativista também reforçou ser necessário trabalhar a pauta LGBT+ atrelada à luta pelos direitos humanos.
Clique aqui e assista a intervenção de Deborah Sabará.
*Matéria redigida com a apuração e o apoio de Viviana de Paula Corrêa, TAE da Diretoria de Ações Afirmativas e Diversidade da Proaeci. Com informações de Rafael Berbigier de Bortoli, Antonieta Xavier e Isis Duarte da Assufrgs.